eu quase morro


quedas livres e descidas de barranco são momentos onde, por mais que você queira, não consegue raciocinar direito. muito menos enxergar quanto tempo de queda ainda tem por vir. e se a queda não é livre, quando você começa a pensar que logo vai terminar, suas costas batem contra o mesmo morro que, ironicamente, foi você quem fez tão alto e tão difícil de subir. 

não se aguenta de dor. segue o deslize que alternando entre tentar agarrar-se a algo e lamentar pelas dores que sente nas mãos vem uma súplica por uma ajuda que não virá. uma lágrima por uma dor que não nem se sabe de onde vem. o corpo esquenta e finalmente você de tanto tentar, vai descendo menos rápido do que antes - vem uma memória de alguém que você gosta. finalmente pensa que vai conseguir passar por mais essa etapa... mas se deslizando estava péssimo quem diria agora que começa a rolar. e do nada uma imagem louca de como tudo isso começou. chega na beiradinha não consegue segurar - fica presa pelo ganchinho de jeans que ainda lhe resta e quase inconsciente tem a oportunidade de pairar no ar e ver tudo o que já desceu. 

e tudo o que a ainda possivelmente, vai descer se nada fizer.
fraca porém forte, recolhe os restos de força e tenta se estabilizar. sabe que não vai ter força pra subir tudo no mesmo dia, talvez isso lhe tomaria vários deles e talvez o que lhe restasse de energia, mas ia tentar. quando respirou fundo e achou que já poderia vencer, esticou as pernas para finalmente poder alcançar aquela pedra que pareceu mais sólida.
mas a pedra moveu-se.


desequilibrou-se. 


tudo ficou em silêncio... até finalmente fechar os olhos e continuar a descer.

batendo as pernas, abrindo os braços, agarrando em o que quer lá que fosse - mas não mais confiando nas pedras, a resistência durou menos de 5 segundos até decidir que já não ia mais lutar. tal resistência apenas machucava mais e lhe enchia olhos de terra. colocou as mãos no rosto e pensou: acabou. pensou em quem deixou lá em cima; quem lhe empurrou; se alguém empurrou ou se simplesmente caiu. sentiu as costas rasgadas rasgando cada vez mais e sabia que tinha tentado enquanto podia. depois dessa certeza só pensava - em meio a uma nova dor ali e acolá - no que, onde e quem ia encontrar lá no fim. estaria consciente? estaria morta? conseguiria andar de novo? um barulho mais alto e de repente, parou de girar. de todas as dores das dores, a pior delas: estava quebrada, destruída.

rolando o morro eu quase morro até ser acolhida por ninguém menos que o chão.  só ele. finalmente. 
mas ainda andava. 
já tinha o suficiente pra começar a construir outro morro, de novo.

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