aprenda a dividir
tinha mais ou menos duas décadas que não sabia conjugar o verbo compartilhar. nunca considerou isso um problema anormal: não gostava mesmo.
dividir o espaço, dividir os horários. separar guarda roupa entre as que pode e as que não pode.
a-ver-são a dividir. nem mordida de lanche, gole de suco, lambida no sorvete, a última bala e um pedaço de sentimentalidade. era bem estranho. mas era real, seguro. cheio de barreiras. muros.
confessou sentir-se anormal por gostar de ser assim, de viver para si. não que não soubesse que não precisava ser daquela forma: apenas gostava e não via mal! mas nem por isso deixou de partilhar dos alheios, segundos e terceiros sem oferecer nada em troca.
egoísta. inerte.
de repente, estranhou ao sentir normal quando teve o espaço invadido. demarcado. refletiu e, pretensioso, duvidou que tal alguém pudesse estourar a barreira ou a derrubada da murada - uma mania frustrante de subestimar. conjugou o verbo duvidar por muito tempo e achou normal a paciência alheia. quando qualquer sensação de reciprocidade começou a brotar, lhe ofereceu uma gaveta. um travesseiro. um pouco de carinho. e desesperou-se por encontrar desdém, barreiras, muros. inércia.
tinha demorado demais.
na sozinhez, conformou-se com a realidade. não sabia dividir.
continuaria a comer tudo sozinho até parar de duvidar.
gordo.
25/08/2009